Páginas

quinta-feira, 28 de março de 2013

Sermão das Sete Palavras


Sermão das Sete Palavras

Introdução
As sete últimas palavras de Cristo na cruz, para rasgar o véu do templo (cf. Mt 27,51), e nos colocar diante do Pai, nos transmitem um testemunho que passa pelo caminho da dor, do abandono, das impossibilidades, da misericórdia e do perdão. No alto da cruz está um homem que sofre nossas dores e nelas – nas dores mais agudas da alma humana – se faz amigo das horas de solidão, das dificuldades dos apertos e sofrimentos.
Muitas e muitas vezes nos sentimos perdidos, solitários, abandonados dentro de nossa própria casa, de nosso trabalho e de nossa vida. Um abandono que nos leva a tristeza de não enxergar esperanças. Jesus, na solitária cruz, não deixa que a amargura lhe tome o coração, mas, ao contrário, mesmo sentido as dores de sua Paixão nos abre um caminho para fora de nosso isolamento.
Um caminho que passa do interior para o outro, que passa da solidão para o encontro, da dor para a alegria e nos ensina que toda a redenção começa no coração do homem e o leva até o Pai. Jesus saiu de sua solidão para um encontro com seu Pai e neste encontro nos conduziu consigo até o alto.
E nós? Que papel nos cabe neste caminho? Quais os passos que devemos dar? Se percebermos, temos cada vez menos conseguido lidar com várias coisas que nos afligem: os homens cada vez menos conseguem lidar com suas questões interiores, com suas dores, com suas vidas; as mulheres cada vez mais audaciosas nos seu ambientes de trabalho são cada vez menos donas de seu interior e vez por outra se submetem a situações que as colocam num vale de solidão; os jovens, cada vez mais ávidos de uma liberdade sempre acabam se entregando à ciranda da vida que não os deixam senão com uma imensa culpa e, mergulhados na tristeza de seus atos, vivem uma vida que carece de sentido e expectativas.
Essa é a dor da nossa cruz: a incompreensão, o abandono, a pobreza interior que amesquinha o ser humano, a dolorosa cruz que nos marca a vida interior...
É nesse momento que Jesus, no alto da Cruz nos da sete passos para sair das agitações interiores para uma liberdade que nos permite um encontro com Deus e nele descobrirmos um amigo interior que nos faz sair da solidão para a Amizade.

1ª PALAVRA: “Pai, perdoa-lhes, pois não sabem o que fazem”.
Não sabemos o que fazemos? Será que poderíamos tomar para nós essa palavra? Quando nossos atos não correspondem ao amor a que nos propusemos, quando nossa hipocrisia não nos permite a auto crítica que nos tempera em nossos arrazoados, muitas vezes cheios das melhores intenções, mas eivados de arrogância e  tirania? À primeira vista o modo como nos cobramos, rígidos e implacáveis, não nos permite ser receptores deste perdão.
Mas ali no cenário do calvário as palavras dirigidas aos algozes de Cristo ressoam por toda a terra em todo tempo incluindo a cada um de nós na história, até hoje!
Se nossa escola de vida nos permite a dureza, a radicalidade, a implacabilidade conosco e com os outros, a escola da cruz oferece a lição do perdão. Não somos perdoados pelo quanto merecemos – nós, por nós mesmos não o merecemos. Somos perdoados pelo quanto Cristo nos amou e se é esse amor a medida do perdão, Cristo, que ama sem limites oferece um perdão que é infinito.
Por isso também nós devemos nos perdoar. Quero dizer que cada um deve perdoar a si mesmo antes de tentar perdoar aos outros. Você pode hoje olhar para dentro de si mesmo, como quem afrouxa o nó da forca do seu próprio juízo e sentir-se presente diante de um juiz mais misericordioso que nós mesmos.
Quando nos aproximamos de Jesus Crucificado para ouvir de seus lábios, sôfregos pelas dores que o tocam o corpo e a alma as palavras de perdão, devemos lembrar que somos, enquanto seres humanos, imperfeitos e limitados e, se isso nos causar a dor, temos alguém que, como um companheiro de viagem, um amigo, nos fez perceber que nossa perfeição esta exatamente centrada na capacidade de sermos melhores a cada dia e não de nos reconhecermos prontos e acabados... um homem que não tem espaços abertos para o crescimento é um homem morto, mas aquele que na solidão de seus sofrimentos consegue encontrar uma porta aberta para ser melhor, isto é, para transcender... um amigo foi a nossa frente e nos ensinou a não parar na cruz da auto punição, mas ir até a ressurreição de nossa consciência: Pai, perdoai-nos por que não sabemos que o amor é melhor do que a culpa.

 2ª PALAVRA: “Em verdade te digo: hoje estarás comigo no Paraíso”
Uma promessa? Não, amigos não fazem promessas! Amigos realizam! Jesus ao olhar para o ladrão não o escolhe por ter sido uma pessoa com uma trajetória de vida sem erros, não o elege por ser irrepreensível, não o faz amigo por ser melhor do que todos os outros. Esses critérios não são os critérios do Cristo, mas os nossos.
Somos assim nas nossas escolhas: vemos primeiro o exterior, vemos primeiro os benefícios, escolhemos primeiramente aqueles que nos possibilitam quaisquer crescimentos. Mas quando fazemos isso não nos colocamos abaixo? Quando discriminamos alguém, o colocamos em grau inferior, mas quando supervalorizamos alguém, NOS COLOCAMOS em grau inferior.
Jesus da o maior dom, o da felicidade, isto é, o céu, a um ladrão!
Também não reside a bondade de Cristo no fato de ser o seu “novo amigo” um ladrão. Não é o fato de ser minoria que faz de alguém privilegiado. No mundo de hoje, vemos a ditadura das minorias que viram no fato de serem, de algum modo, discriminados um direito a, como quem paga com a mesma moeda, discriminar. O valor do ser humano reside nele mesmo enquanto tem algo de divino em si.
Jesus da o maior dom, o da felicidade, isto é, o céu, a alguém que se sabia limitado e culpado, mas que acreditou na misericórdia inocente e ilimitada de Deus.
Também nós nos encontramos hoje, crucificados pelo tempo presente: nossos conflitos interiores são nossos algozes; nossa solidão, o açoites; nossa impaciência, os cravos e nossas culpas a lança que perfura o nosso peito com sentimentos de dor e rejeição por nós mesmos e por outros.
Mas também hoje estas palavras nos atraem para Cristo, como ele mesmo havia prometido (Cf. Jo 12, 20-33). Mesmo neste mundo, ao encontrarmos Jesus, nosso amigo interior que está sempre conosco, podemos viver à porta do paraíso, como diz o salmista: “Verdadeiramente, um dia em vossos átrios vale mais que milhares fora deles. Prefiro deter-me no limiar da casa de meu Deus a morar nas tendas dos pecadores”. (Sl 83,11).
Só alguém que se sente perdoado, pode perdoar e por isso, a comunidade de amigos é a Igreja do Perdão onde se poder oferecer e receber a graça da salvação todos os dias no próximo, na palavra e no pão eucarístico sinal de reconciliação com Deus.
A palavra que ouvimos de Cristo nos dá a graça de estar no limiar do céu, como comunidade eclesial, viver na alegria do perdão e da amizade.


3ª PALAVRA: "Mulher, eis aí o teu filho. Filho eis aí a tua Mãe!"
Neste caminho de salvação que nos tira do egoísmo e nos coloca na fraternidade e na amizade, um rosto nos é dado: Maria, a Virgem do Amor Perfeito. Sofrendo no coração e na alma o que Cristo sofria no seu corpo, Maria é a primeira aluna da escola do amor.
A dor de ver seu filho não a torna avessa ao mundo, mas o acolhe com amor como seus filhos, no Cristo. Ai está tua mãe, pronta a te acolher, não deverias tu também, de prontidão acolhe-la? E acolhendo-a como Mãe do Amor Perfeito, acolher também a todos os teus irmãos?
Em Maria o exemplo do amor que supera a dor, o amor que supera a mágoa, o amor que acolhe!
Filho, eu te digo hoje, como Cristo no alto da cruz: Eis ai o exemplo de tua mãe!

4ª PALAVRA: "Elói, Elói, lammá sabactáni? - Meus Deus, meus Deus, por que me abandonastes?"
Nos abandonos do teu coração um eco destas palavras deve trazer a tua vida um sopro de esperança. Quando a solidão é o ultimo grito da dor que nos fez sentir abandonados, Cristo é nosso companheiro. Ele sofre em nós.
A ressurreição é um trabalho de dentro para fora, feito a duas mãos: a mão de Cristo, que nos ajuda a plantar nosso jardim interior e a tua própria mão, já que você é o único capaz de mudar tu história. Cristo está te chamando a se abandonar na amizade dele para que nos teus abandonos interiores ele seja o teu amigo, aquele que te acompanha.

5ª PALAVRA: "Tenho Sede!"
Que sede temos hoje? Sede do mundo? Mas se buscamos água em cisterna rachadas (Jr 2, 13) só encontraremos a aridez da vida. Bem disse o Senhor à SamaritanaTodo aquele que beber desta água tornará a ter sede, mas o que beber da água que eu lhe der jamais terá sede. Mas a água que eu lhe der virá a ser nele fonte de água, que jorrará até a vida eterna”. (Jo 4,13-14)
No episódio da Samaritana, bem como no alto da cruz, Jesus mostra a sede pela salvação de seus amigos nos ensinando a ter uma dupla sede: a da salvação de nossos amigos, isto é da elevação de cada um deles até a felicidade – e para isso devemos nos esforçar para que sejam cada vez melhores e não nos acostumar com as mediocridades mundanas; e a sede de Deus, por que nossa alma estará sempre inquieta até repousar em Cristo (Santo Agostinho, Confissões).
Na sede de Cristo pela salvação de seus amigos, deve também estar a sede de felicidade que nos toca, por que ser feliz é estar com Deus, devemos querer para todos a mesma felicidade que livra da culpa, que nos tira do isolamento, que nos leva ao encontro com Deus e com nosso próximo. Pelo caminho da amizade encontrar a santidade e nela o dom da felicidade.

6ª PALAVRA: "Tudo está consumado!"
Depois de passarmos pelas dores de nossas próprias culpas aprendendo a perdoar nossas faltas e as dos outros. Depois de recuperar o limiar da esperança e buscar a força da solidariedade, veremos consumada uma Igreja de Fiéis. Uma verdadeira Igreja de amigos que, chamados desde toda a eternidade, encontram-se na fraternidade e no amor a finalidade para a qual Deus nos congregou como amigo: testemunhar aqui a possibilidade do céu pelo amor a si mesmo, ao Próximo e a Deus.
Um caminho que não se faz sozinho. Um caminho que se faz em comunidade: Eu, o Cristo e meu Irmão... nesta amizade Deus se revela próximo e salvador.

7ª PALAVRA: "Pai, em tuas mãos entrego o meu Espírito!"
Só tuas mãos senhor, chagadas e abertas, podem nos livrar do egoísmo e da dor. Só tuas mãos, Senhor, podem nos livrar da incredulidade pela qual o mundo passa. Colocamos nossa vida em tuas mãos por que não há lugar melhor para nós e assim, por tuas mãos chagadas, em cada missa, em cada comunhão, como amigos e companheiros de caminhadas somos entregues ao Pai.
No teu Espírito, o nosso espírito. Na tua santidade a nossa comunidade para que recebamos um novo Pentecostes de amor que nos reanime a fé.

Nenhum comentário:

Postar um comentário