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terça-feira, 22 de março de 2011

O Ser Humano não está em extinção!


 

21 de março de 2011. Chega a revista “Época”, da qual sou assinante e procuro ler com freqüência para estar inteirado das notícias do país. Uma página de merchandising, um carro nas seguintes. Folheando, folheando... Página 13... Opa! Primeiro Plano: “Personagem da semana: ‘Pinpoo, a volta do cão prodígio’.”
Um vira-lata desaparecido que foi reencontrado depois de 15 dias desaparecido, após ter sido despachado num aeroporto por meio de uma empresa aérea. Página seguinte a integra da matéria, com um final feliz: “Às 22 horas da quarta-feira, dia 16, Nair Flores [a dona do vira-lata] recebeu uma ligação eufórica da mulher do sargento da Brigada Militar Paulo Ribas da Silva, de 53 anos. Ele e dois soldados do batalhão encontraram o cachorro nas cercanias do Salgado Filho [aeroporto em Porto Alegre]. ‘Quando soubemos da fuga, virou questão de honra capturar o cachorro, que andava nas redondezas’ conta Ribas, dono de dois cães. Por três dias, ele bolou estratagemas para capturar Pinpoo”.
Mais uma página e uma anta! A chamada da matéria, na coluna “Fala Brasil” noticiava que o IBAMA conseguira autuar um fazendeiro de Mato Grosso por caça ilegal de animais silvestres por meio de exame de DNA. O fazendeiro havia dito que a carne que secava ao sol era de porco, quando na verdade era de capivara. Dizia ainda que em 2008 os agentes apreenderam uma porção de carne moída cujas análises demonstraram ser carne de anta.
Lá pelas tantas, na página 41, um cachorro da raça mastiff tibetano, nomeado Hong Dong vendido por 2,5 milhões [o cão mais caro do mundo] dividia a edição com a propaganda da Petrobras, que trazia a foto de uma tartaruga marinha nadando, e anunciava que “todo ser vivo é igual. Todos precisam de água” e que a empresa iria investir, até 2012, R$ 500 milhões no Programa Petrobras Ambiental, que inclui a preservação de recursos hídricos.
Para os leitores, até aqui, nada de mais. Preocupação com animais, ecologia, recursos hídricos. Tudo na mais perfeita ordem se não nos deparássemos, fora das páginas da revista, com a depreciação do ser humano.  
Ao que parece, os animais, a natureza e a ecologia são preferidas à preservação do ser humano. Essa idéia, apesar de não ser uma novidade, tem sido passada muito fortemente (ao mesmo tempo em que veladamente) em vários ambientes. Essa corrente de pensamento tem nome: neo-naturalismo e equipara à natureza humana a natureza vegetal e animal.
Um expoente deste pensamento é Michael Tooley. O neo-naturalismo propõe a redução qualitativa e quantitativa do ser humano para garantir a continuidade da perspectiva ecológica. Assim, é preferível a morte de um recém-nascido que a tortura de um animal ou a queimada de florestas.
Para quem achou exagerada e absurda a proposta, saibam que isto não está longe de nós! Por exemplo, as câmaras de vereadores de Florianópolis e do Rio de Janeiro proibiram a pesquisa cientifica com alguns animais, mas, não raro, vemos muitíssimos políticos defenderem o aborto, as pesquisas com células tronco embrionárias e a morte de anencéfalos.
Na contramão daquelas nefandas opiniões, afirma o Papa Bento XVI, ao enviar sua mensagem por ocasião da Campanha da Fraternidade de 2011:

“O homem só será capaz de respeitar as criaturas na medida em que tiver no seu espírito um sentido pleno da vida; caso contrário, será levado a desprezar-se a si mesmo e àquilo que o circunda, a não ter respeito pelo ambiente em que vive, pela criação. Por isso, a primeira ecologia a ser defendida é a “ecologia humana” (cf. Bento XVI, Encíclica Caritas in veritate, 51). Ou seja, sem uma clara defesa da vida humana, desde sua concepção até a morte natural; sem uma defesa da família baseada no matrimônio entre um homem e uma mulher; sem uma verdadeira defesa daqueles que são excluídos e marginalizados pela sociedade, sem esquecer, neste contexto, daqueles que perderam tudo, vítimas de desastres naturais, nunca se poderá falar de uma autêntica defesa do meio-ambiente.”

Com este simples parágrafo o Pontífice solapa não só as perspectiva de Tooley, mas também as idéias de Skinner, para quem a verdade é um objetivo alcançado através do mensurado e quantificado, isto é, um conhecimento válido e experimental, enquanto os conceitos como pessoa, natureza e dignidade humana, bens fundamentais e outros perdem sua cientificidade; as idéias de M. Farrell, D. Lyons e T. Scanlon que reconhecem o direito a vida e seus correlatos (direito a ser concebido na família e através do ato conjugal), mas insistem que esses direitos não estão necessariamente presentes em casos concretos e pontuais e podem ser deixados de lados para o crescimento social; as teses de Foucault que negam a titularidade dos direitos humanos, já que o ser humano é constituído por estruturas inconsciente e, desse modo, a vida da pessoa humana pertence ao grupo que detém o poder de modo que, quando o proletariado tomasse o poder, poderia coagi-la com violência sangrenta; os absurdos de H. Triston Engelhardt e R. Dowokkin (dois autores muito presente na área da bioética) que, embora aceitando a natureza humana, seu valor e o conceito de pessoa humana, afirmam a distinção entre ser humano e ser pessoa, abrindo caminhos de morte, por que só pessoas têm direito e em particular direito a vida, mas que, o ser humano só é pessoa quando é adulto capaz de arrazoados e responsável por seus atos de modo que os não nascidos, doentes, deficientes são seres humanos, mas não pessoas e por isso não têm direito a vida e podem ser mortos.
Decerto, o leitor pode não ter conhecido os autores que citamos neste artigo, no entanto, certamente já se deparou com essas idéias, de modo velado ou não e, pode até ter concordado com elas sem ver o que está por detrás de cada um dos arrazoados sem razões legítimas e sem saber que, no fundo, concordava como uma cultura de morte.
Vem em nosso auxílio o Magistério Papal de Bento XVI que nos ensina que:

“O primeiro passo para uma reta relação com o mundo que nos circunda é justamente o reconhecimento, da parte do homem, da sua condição de criatura: o homem não é Deus, mas a Sua imagem; por isso, ele deve procurar tornar-se mais sensível à presença de Deus naquilo que está ao seu redor: em todas as criaturas e, especialmente, na pessoa humana há uma certa epifania de Deus. «Quem sabe reconhecer no cosmos os reflexos do rosto invisível do Criador, é levado a ter maior amor pelas criaturas» (Bento XVI, Homilia na Solenidade da Santíssima Mãe de Deus, 1 de Janeiro de 2010).”

Não esperemos que o ser humano seja declarado “espécie em extinção” para defendermos os valores da cultura da vida, mas, ao contrário, nos empenhemos com atitudes de vida para um mundo que entenda, viva e colabore para que outros tenham vida plenamente.